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Viúvo de Antonio Cicero sobre escolha do marido: “Uma morte digna”
O viúvo de Antonio Cicero, Marcelo Pies, deu detalhes sobre a decisão do marido de morrer por meio de um suicídio assistido — diferente da eutanásia, no procedimento, a pessoa mesma ingere ou aplica uma substância letal no corpo. O poeta morreu nesta quarta-feira (23/10) após passar pelo procedimento na Suíça.
Segundo o relato feito ao jornal O Globo, a decisão de Cicero foi “puramente racional”. Além disso, o imortal da Academia Brasileira de Letras optou por não revelar a decisão para ninguém além do marido.
“Ninguém foi consultado. Antonio não queria. Ele só avisou ontem (na terça-feira, dia 22) a irmã Marina, que ficou arrasada, mas entendeu e aceitou sua posição”, explicou Pies. Ainda segundo fontes do jornal, a cantora Marina Lima estaria inconsolável e sem condições de falar sobre o assunto.
“Cicero era muito racional. Ele tinha urgência (em realizar o procedimento), pois temia que a doença piorasse e perdesse de repente a plena consciência, o que impediria todos os planos. Foi uma escolha puramente racional”, enfatizou ainda o viúvo.
O figurinista, que foi casado com Antonio Cicero por 40 anos, revelou que o suicídio assistido seria feito, inicialmente, em agosto. Mas o procedimento foi adiado por Marcelo Pies estar ocupado com o trabalho na série, ainda inédita, Praia dos Ossos.
Ele relembra ainda que o poeta sempre foi um defensor da liberdade de se realizar eutanásia e suicídio assistido. “Nisso, ele foi de uma coerência admirável. Por isso, não reagi com tanta surpresa (a essa decisão)”, completou.
“Com toda a certeza, foi uma morte digna. Antonio morreu em paz, segurando a minha mão, muito tranquilo e sem nenhuma ansiedade. Depois do medicamento, ele dormiu e, em meia hora ou um pouco mais, morreu. O futuro para quem tem Alzheimer é sabido. Ainda não há cura nem tratamento eficaz. Respeitei a decisão dele e o apoiei. Admiro imensamente a coragem e a determinação. Ele sempre apoiou todas as formas de liberdade, e essa foi mais uma”, finalizou.
Caso Antonio Cicero: onde morte assistida é permitida e como funciona
Cicero foi diagnosticado com Alzheimer e lidava com problemas neurológicos decorrentes da doença há alguns anos. O marido dele, o figurinista Marcelo Pies, revelou, em comunicado a pessoas próximas, que o imortal vinha planejando o procedimento há algum tempo.
O país escolhido por ele foi a Suíça, onde o suicídio assistido é permitido desde 1942, tanto para nascidos no páis, quanto para estrangeiros. Para a realização do procedimento, o indivíduo recebe uma substância letal e a ingere ou a aplica nele mesmo — diferente da eutanásia, que é quando uma outra pessoa, geralmente um médico, aplica a substância no paciente.
Quem tem interesse em passar pelo suicídio assistido não precisa ter uma doença terminal, mas tem que ter a mente sã e expressar o desejo consicente de encerrar a vida. Após isso, a pessoa precisa oferecer uma série de laudos médicos e outros documentos que passarão por longa análise.
Embora o suicídio assistido seja permitido na Suíça, a eutanásia não é. Na Holanda, os dois procedimentos são permitidos, mas é exigido que a pessoa tenha uma doença incurável ou esteja passando por um sofrimento tamanho, que não haja expectativa de melhora.
Outros países que também legalizaram ambos procedimentos são Bélgica, Canadá, Espanha e Luxemburgo. Cada um possui regras específicas, que se assemelham pelo ponto principal da exigência de diagnósticos que causem grandes dores. Em Portugal, apenas a eutanásia é permitida.
Leia a carta de despedida de Antonio Cicero após optar por morte assistida
O poeta e filósofo Antonio Cicero morreu nesta quarta-feira (23/10), aos 79 anos. Membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) e irmão da cantora Marina Lima, ele tinha Alzheimer e optou pela eutanásia na Suíça.
Com a notícia da morte, foi divulgada uma carta em que Cicero, que colaborou com letras de algumas das principais canções de sua irmã, como Fullgás e Pra Começar, explica sua decisão.
“Queridos amigos, encontro-me na Suíça, prestes a praticar eutanásia. O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer. Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem”, começa o poeta na carta.
“Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi. Não consigo mais escrever bons poemas ou bons ensaios de filosofia. Não consigo me concentrar nem mesmo para ler, que era a coisa de que eu mais gostava no mundo. Apesar de tudo isso, ainda estou lúcido bastante para reconhecer minha terrível situação”, continua.
Por fim, o artista agradece amigos e se despede: “A convivência com vocês, meus amigos, era uma das coisas – senão a coisa – mais importante da minha vida. Hoje, do jeito em que me encontro, fico até com vergonha de reencontrá-los. Pois bem, como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo. Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade. Eu os amo muito e lhes envio muitos beijos e abraços!”.